quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Natal, 1° de julho de 2014.

Painho,

Muito obrigado...

Pela porta fechada que prolongou o sono;

Pelo lençol ajeitado nas manhãs frias de inverno;

Pela bênção antes de cada partida matinal;

Pelas luzes na ladeira anunciando o retorno;

Pelos banhos de sangria braba e rio cheio;

Pelos pirões emuriçocados à beira d’água;

Pelas boiadas tangidas em terras distantes;

Pelos treinos de tiro na chapada da serra;

Pelas práticas de direção onde houvesse chão;

Pela confiança em madrugadas adolescentes;

Pela certeza do apoio nas horas difíceis;

Pelo chamamento às responsabilidades;

Pelo embalo dos netos no barrigão;

Por ser para os meus filhos o avô de que tanto sinto falta;

Pela presença em minhas ações mesmo na ausência;

Pelo exemplo de destemor que me faz seguir adiante;

Por ser o limite, o respeito e a força que me fazem Homem.

Pela riqueza de sua presença e sua figura de Pai em minha vida, minha herança imperecível.

Que Deus nos permita tê-lo em nossas vidas por longos anos e que meus filhos possam ter de mim pelo menos parte do que você me trouxe. Esforço-me por ser digno da missão.

Feliz aniversário, meu Pai.

Nunes Neto.


terça-feira, 1 de abril de 2014

J. R. Guzzo em Veja - 02/04/2014

Pode ser uma coisa que muita gente acha desagradável ouvir, e por isso é melhor dizer logo, para não gastar o tempo do leitor com prosa sem recheio. É o seguinte: os brasileiros fariam um grande favor a si mesmos se tomassem a decisão de ficar, com o máximo de clareza e na frente de todo mundo, a favor da polícia. Isso mesmo: a favor da polícia, e da ideia de que cabe exclusivamente a ela, numa democracia que queira continuar viva, o direito de usar a força bruta para manter a ordem, cumprir a lei e proteger o cidadão. Tem, também, a obrigação legal de fazer tudo isso. Algum problema? É exatamente assim em todos os regimes democráticos. Eis aí, na verdade, uma afirmação evidente em si mesma; pode ser entendida sem a menor dificuldade após um minuto de reflexão. Mas estamos no Brasil, e no Brasil o que parece ser um círculo, por exemplo, é muitas vezes considerado um triângulo, ou um quadrado, ou qualquer outra coisa que não seja o diabo do círculo.

No momento, justamente, passamos por um desses surtos de tumulto mental. Segundo o entendimento de boa parte daquilo que se considera o “Brasil pensante”, “civilizado” ou “moderno”, nosso grande problema não é o crime, mas a polícia. Parece bem esquisito pensar uma coisa dessas, num país com mais de 50 000 assassinatos por ano e índices de criminalidade que estão entre os piores do mundo. Onde esses pensadores estão vendo o problema de que tanto falam? Vai saber. Os verdadeiros mistérios desse mundo não são as coisas invisíveis, e sim as que se podem ver muito bem. No caso, o que se pode ver com a clareza do meio-dia é a fé automática de boas almas e mentes num mandamento que ouvem desde crianças: o criminoso brasileiro é sempre “vítima das desigualdades sociais”, e o policial está errado, por princípio, quando usa a força contra ele. Seu dever, como agente do Estado, seria tratar os bandidos como cidadãos que precisam de ajuda, para que tenham oportunidade de entender por que não deveriam matar, roubar, estuprar e assim por diante. Será que esse jeito de pensar é alguma tara que nos sobrou do regime militar, quando polícia e liberdade eram coisas opostas? De novo: não se sabe.

Praticamente todos os dias há exemplos claros desse curto-circuito geral na capacidade de separar o certo do errado. O cidadão é assaltado, brutalizado, ferido — e no dia seguinte lê, ouve ou vê mais uma reportagem denunciando a polícia por algum erro, real ou imaginário. Ainda há pouco, o país teve oportunidade de testemunhar políticos, intelectuais e “celebridades” em geral, com a colaboração maciça da mídia, colocando a polícia no banco dos réus por reprimir bandos de marginais que vão para a rua decididos, treinados e equipados para destruir. Segundo essas excelentes cabeças, a polícia cria um “clima de violência” e de “provocação” que “força os ativistas” a se defenderem “previamente”. Para isso, veem-se obrigados a incendiar bancas de jornal, destruir carros, quebrar vitrines de loja e por aí afora. Esse tipo de julgamento vai se tornando mais e mais aceitável no Brasil de hoje. Deve ser maior do que se pensa o número de pessoas que não querem ter a tranquilidade de sua fé perturbada por fatos ou por conhecimentos; além disso, cabeças em que não há ideias são sempre as mais resistentes a deixar alguma ideia entrar nelas. Quanto à imprensa, rádio e TV, acreditem: o que mais gostam de fazer é falar as mesmas coisas, pois se sentem mais seguros quando um repete o outro e todos atiram nos mesmos alvos. Alguém já viu, por exemplo, algum jornalista arrasando o técnico do Olaria?

Não há sete lados nesse debate. Só há dois, um que está a favor da lei e o outro que está contra — e aí o cidadão precisa dizer qual dos dois ele realmente apoia. O primeiro é a polícia. O segundo é o que leva o crime para a rua. A única pergunta relevante, num país que tem uma Constituição em vigor, é: de que lado você está? Não vale dizer “depende”, ou declarar-se a favor da ordem, desde que a tropa se comporte com altos níveis de civilidade, seja muito bem-educada, fale inglês e não bata nunca em ninguém, nem cause nenhum incômodo físico a quem esteja jogando coquetéis molotov na sua cara, ou sacando armas contra ela. A questão real é apoiar hoje a polícia brasileira que existe hoje – não dá para chamar a polícia da Dinamarca, por exemplo, para substituir a nossa, ou tirar a PM da rua e só chamá-la de volta daqui a alguns anos, quando estiver suficientemente treinada, preparada e capacitada a ser infalível. É mais do que sabido que a polícia do Brasil tem todos os vícios registrados no dicionário, de A a Z. Mas, da mesma maneira como não é possível fechar todos os hospitais públicos que funcionam mal, e só reabri-los quando forem uma maravilha, temos de conviver com a realidade que está aí. É indispensável transformá-la, mas não dá para exigir, já, uma corporação armada que precise ter virtudes superiores às nossas.

A polícia, por piores que sejam as condutas individuais dos seus agentes e seus níveis de competência, é uma peça essencial para manter a democracia no Brasil e impedir a tirania daqueles que só admitem as próprias razões. É a polícia, na verdade, o que a população brasileira tem hoje de mais concreto na garantia de seus direitos. Alguém pode citar alguma força mais eficaz para impedir que o Congresso, o STF e o próprio Palácio do Planalto sejam invadidos, metidos a saque e incendiados? A PM está do lado do bem – goste-se ou não disso. No mundo das realidades, é ela a principal defesa que o cidadão tem para proteger sua vida, sua integridade física, sua propriedade, sua liberdade de ir e vir, o direito à palavra e tudo o mais que a lei lhe assegura. A autoridade policial já erra o suficiente quando falha ao cumprir quaisquer dessas tarefas. Não faz nexo criticá-la nas ocasiões em que acerta.

Não serve a nenhum propósito útil, igualmente, dar conforto ao inimigo – o que nossa elite pensante, como dito anteriormente, faz o tempo todo. O inimigo não vai deixar de ser seu inimigo; você não ganhará sua admiração, nem será deixado em paz. É um desafio à lógica, neste sentido, achar que delinquentes teriam a licença de armar-se para assegurar seu direito de “legítima defesa” contra a repressão policial. A lei brasileira, com todas as letras, diz que só a polícia tem o direito de portar armas, e de utilizá-las no combate ao crime e na defesa do cidadão — salvo em casos excepcionais, que exigem licença específica. Dura lex sed lex, claro. Mas não é só uma questão legal. Trata-se de simples sensatez. No caso dos atos de protesto — qual o propósito de levar para a rua mochilas com bombas incendiárias, estiletes, barras de ferro e outros artefatos desenhados unicamente para machucar? Por que alguém precisaria de qualquer dessas coisas para expressar suas opiniões em praça pública?

O Brasil vem se acostumando nos últimos anos à ideia doente de que mostrar simpatia diante da delinquência e hostilidade diante da polícia é uma questão de princípio — uma atitude socialmente avançada e politicamente progressista. Quem não pensa assim é visto como um homem das cavernas, extremista e inimigo da democracia. Mas é o contrário: opor-se ao crime e apoiar a polícia é ficar a favor da liberdade. Está na moda denunciar, com apoio da caixa de amplificação da imprensa, delitos como a “pregação do ódio”, “apologia do crime” ou “incentivo ao racismo”. Esse mesmo tribunal, entretanto, aplaude como uma forma superior de cultura popular os rappers que pregam abertamente, em suas músicas, o assassinato de policiais. Ilá alguma coisa muito errada nisso aí. Está na hora de deixar claro: é falso acusar de “histeria” e outros pecados mortais quem não acredita, simplesmente, que no Brasil de hoje existe algum assaltante que rouba e mata porque está com fome ou tem de sustentar sua família; o que há é gente que quer satisfazer todos os seus desejos sem ter de trabalhar ou de respeitar o direito alheio.

Em Cuba, regime-modelo para nosso governo, são chamados de sociopatas e enterrados na cadeia mais próxima, sem que a “sociedade” seja chamada a “debater” coisa nenhuma.


Deus não precisou da ajuda dos brasileiros para criar o Brasil. Mas, como diria Santo Agostinho, só poderá nos salvar se tiver o nosso consentimento.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Aos Filhos dos Nossos Filhos

Natal, 27 de março de 2000.

Ontem, à hora de deitarmos, mais uma vez ele retomava aquele assunto. Não era a primeira vez naquele fim-de-semana. Estranho seu repentino interesse por tal tema. Melhor, estranho que nos pareça estranho ante a previsibilidade de fato tão marcante e inexorável. Os recém-chegados talvez guardem melhor as lembranças da época que precedeu seu retorno. Tentaremos não desnaturalizar-lhe o entendimento.

- Painho, quando a gente morrer, a gente vai pro céu?

- Sim.

- A gente vai ver a mãe de vovó Graça?

- Sim, filho, veremos bisavó Josefa.

- E bisavô Damião?

- Também!

- A gente vai ver Jesus?

- Sim! Respondi convencendo a mim mesmo quanto à esta última benção.

- E quem mais?

- Bisavô Lycurgo, bisavó Cristina...

- Quem é ele?

- Tá vendo naquela foto, aquele homem segurando painho na cadeira de balanço? É ele... Bisavô Lycurgo.

Aconteceu muito cedo.

Pude rever a verde mata que ladeia a estrada de Marcelino Vieira logo após o trevo que a faz RN, nosso caminho diário naquele período da vida em que a liberdade estava limitada pelo horizonte e a serra. O tema da conversa é um só; os pensamentos que dela nascem se multiplicam naquelas jovens cabecinhas. O córrego interposto pela estrada transforma-se em pequeno açude que dá frescor ao ar; este já não mais açoita, acarinha. Estarão todos ali nos próximos três ou quatro meses. Existência fugaz, mas abençoada. Viajando por catorze anos de lembranças, aquela sensação me toma outra vez. A mais indescritível das saudades. Saudades do que não tive. Saudades do que poderia ter. Sozinhos, naquele dia comum de fazenda, choramos em silêncio. Alguns anos mais tarde, em comunhão fraterna de pensamentos, soubemos da semelhança do sentir. A falta de quem foi antes, sem que nos fosse permitida a convivência. Lamentávamos por nosso pai já não poder ter alguém tanto quanto nós o temos.

Aconteceu muito cedo.

Em que momento se fazia o sorriso em teu rosto? O que dizias ao nos saudar? O que te fazias bravo? Qual o cheiro dos teus lençóis e camisas? Qual sua música preferida? O que pensavas ao observar a chuva do alpendre? Que outros lugares te vinham à mente ao beber novamente a água do açude após o período de capital? Que imagem te confortava? Perguntas. Não obtive respostas.

As histórias que me contaram sobre ele são muitas vezes repetidas e é subliminar o esforço em adequar o cotidiano de forma a contê-las como máximas e exemplos. Há uma mescla de divino e humano quando repetimos histórias dos nossos. Homenagem imaculada aos que nos são caros ou necessidade de manter acesa a nossa linhagem biológica?

Amor, simplesmente. Amor pelo que nós somos. Pois se o tenro ramo de hoje é a projeção do forte galho de amanhã o largo caule guarda em suas reentrâncias as memórias da jovem muda que um dia fora. As aquisições de uma vida são a essência de muitas outras que lhe sucederão. Somos inteiramente responsáveis pelo porvir, pelos filhos dos nossos filhos, por suas lembranças e ações.

Aconteceu muito cedo. Mas com que autoridade nós, que não percebemos a beleza dos lírios dos campos, julgamos o tempo? Como poderemos perscrutar a motivação dos Céus e sobre o tempo das coisas emitir um juízo certo? Como ver incongruência pontual onde tudo o mais lembra harmonia e perfeição?

Há uma boa explicação! Estejamos aptos a visualizar a vontade reta do destino a outorgar-nos melhores condições de desenvolvimento de nossas potencialidades e por à prova compromissos passados. Mas, sobretudo, tenhamos a certeza que aqueles que se anteciparam na partida haverão de receber-nos um dia, ou por nós serem recebidos, lá ou cá. Porque o amor é grande o suficiente para ser eterno e sublime o bastante para manter-se íntegro diante da ação do tempo ou da distância.

Hoje são 90 anos. Que nos próximos noventa teu reflexo permaneça vivo nas mentes das gerações vindouras, como um guardião a lhes reger os passos, segundo a melodia rítmica de tua aura. Já não somos um apenas. Já não há diferença entre passado e futuro, tudo nos é presente. É Deus disseminando em nós Seus atributos. Que os filhos dos vossos filhos, com a visão mais depurada, possam compreender que se seus pais foram o principal projeto de vida de alguém, eles próprios são a certeza da boa jornada. E que mantenham acesos o amor, o respeito e o exemplos que hoje guardamos como um imperativo maior que nossa própria vontade.

- Bença Pai...

- Deus te proteja meu filho.

L.N.N.

terça-feira, 16 de julho de 2013

A Geração da Incerteza

Pela primeira vez desde a II Guerra, os filhos vivem pior do que os pais na Europa. A eterna juventude virou um pesadelo.

Por Mario de Sabino, de Paris.

Os jovens brasileiros que decidiram ir às ruas para clamar por mudanças têm um país a reformar e uma nação a construir. Não importa a variedade das bandeiras, o seu combustível é a esperança de que o gigante acorde do eterno sono de hino. Ao fim e ao cabo, numa paráfrase otimista da máxima de Roberto Campos, a burrice e os seus apêndices — a corrupção, a improvisação, o descaso — podem ter tido um passado glorioso, mas deparam com um presente raivoso e talvez já não contem com um futuro tão promissor no Brasil. A ver. Do outro lado do Atlântico, naquele que é o berço da cultura ocidental, 100 milhões de jovens europeus enfrentam outro tipo de imortalidade: a da sua própria mocidade.

A eterna juventude é uma quimera que embalou a literatura, impeliu navegantes a buscar a sua fonte em latitudes longínquas e, hoje, está misturada à química da medicina plástica. Na Europa, contudo, na Europa da União Europeia (UE), ou mais precisamente no que era para ser a redentora Europa da zona do euro, a moeda única que circula em dezessete dos 28 países amalgamados numa comunidade de meio bilhão de cidadãos, a juventude eterniza-se em fato estatístico preocupante e pesadelo pessoal diário. É-se jovem por tempo demais, por um período indeterminado que, não raro, dura até que as primeiras rugas começam a surgir e os cabelos brancos, a predominar. A crise econômica, prestes a chegar à segunda infância, mas cujas raízes foram fincadas há pelo menos duas décadas, expôs uma geração juvenil — e outra anterior já nem tanto, na cronologia banal do correr dos anos — sem trabalho e quase sem esperança de crescer. A escassez de esperança corrói o indivíduo, esgarça as tramas familiares e põe em xeque o sonho europeísta. “Não existe país quando não existe trabalho”, resumiu o primeiro-ministro italiano Enrico Letta, na integridade dos seus 47 anos, idade em que muitos dos seus concidadãos ainda dependem dos pais, naquela que é a face mais perversa da pior fase por que passa o continente desde o fim da II Guerra Mundial.

Nas nações em que um mínimo de lógica civilizatória se impôs aos instintos primitivos, o ciclo da existência prevê que os pais eduquem os filhos para que eles vençam as sucessivas etapas da vida, tenham oportunidade de ultrapassar os limites paternos e, eventualmente, os auxiliem na velhice. Pois essa lógica, com as exceções que confirmam o atual desastre, foi subvertida na maior economia do planeta. Como, no jovem, vem se matando o adulto, hoje os mais velhos é que sustentam os condenados à adolescência. O médico e ensaísta brasileiro Afrânio Peixoto, com o perdão da referência tão antiga quanto chamar a Europa de “Velho Mundo”, escreveu que, para os europeus, ciosos da sua reputação, todas as doenças tinham origem estrangeira — a peste era “oriental”; a cólera, “asiática”; a terçã, “tropical”; a febre amarela, “tifo americano”. Os números são ululantes no diagnóstico de que o desemprego juvenil constitui uma afecção essencialmente europeia.

É um quisto nos pulmões, surgido a partir de uma moléstia generalizada. Ele precisa ser combatido imediatamente, sob a pena de se perder o paciente. Duas semanas atrás, os líderes da UE discutiram a questão. Mesmo os falcões cederam à emergência. “O número de jovens sem trabalho é apavorante, um enorme obstáculo à capacidade europeia de competir na corrida global”, reconheceu o primeiro-ministro inglês David Cameron, eurocético como boa pane dos britânicos. Decidiu-se reforçar o pacote Youth Guarantee, ou Garantia de Juventude, para financiar o treinamento profissional de jovens até 25 anos, lançado em fevereiro, com um aporte inicial de 6 bilhões de euros, a ser investidos em quatro anos. Agora, serão 9 bilhões de euros nos próximos dois, com o aceno de mais injeção de recursos em 2016. O dinheiro será investido em treinamento profissional nas escolas, requalificação de quem não consegue voltar ao mercado e troca mais detalhada de informações, para facilitar, por exemplo, que um jovem espanhol encontre um emprego adequado ao seu perfil na Holanda, e por aí segue. A ninharia já é um começo. Acabou a denegação.

O continente de pernas cansadas corre para salvar a sua oxigenação, o que é vital não só para si próprio. A Europa que emergiu da destruição perpetrada pelo ditador nazista Adolf Hitler abriu uma avenida de paz e prosperidade para o mundo ao emprestar melodia única a vozes até então em cacofonias seculares. “A memória da II Guerra Mundial e as exigências da Guerra Fria conduziram três gerações a uma união pacífica sem precedentes na história europeia e inédita em qualquer outra parte”, diz o professor inglês Timothy Garton Ash, especialista em estudos europeus da Universidade de Oxford. Formou-se, assim, um coro por vezes dissonante — porém, coro — que começou a desatinar continuamente somente em 2008, quando a onda de choque financeira, surgida nos Estados Unidos, cortou o crédito abundante que ajudava a escamotear as profundas diferenças na saúde econômica dos diversos cantores.

A partir da crise, ficou evidente como a Alemanha, que logo após a reunificação cambaleava como um "homem doente”, havia se reerguido em toda a sua pujança, graças à “receita Palmirinha”, cujos ingredientes são tão batidos como clara em ovos de bolo: disciplina fiscal e consensos num arco que vai do governo aos sindicatos, das instituições de ensino às companhias. Refratárias à “receita Palmirinha”, Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha. Itália e França mostraram fragilidades decorrentes de máquinas estatais inchadas, sociedades viciadas em doses maciças daquela droga chamada subsídio público e estruturas produtivas engessadas por uma legislação trabalhista arcaica, fruto da aliança entre partidos e organizações sindicais de viés populista. Nesses países encalacrados, a iniciativa de dar emprego é punida com encargos tão ou mais altos do que os que afligem os empresários brasileiros. Um exemplo para turista ver são as lojas e os restaurantes parisienses. Eles deveriam abrir em horários flexíveis, como ocorre nas metrópoles americanas e brasileiras. Afora agradar aos milhões de visitantes da capital francesa e aumentar o lucro dos estabelecimentos, isso criaria uma enorme quantidade de postos de trabalho, especialmente para rapazes e moças dispostos a ganhar algum dinheiro enquanto o restante dos empregados folga. Mas não: lojas e restaurantes são impedidos de fazê-lo, a não ser que os proprietários paguem uma taxa para tanto. Ou seja, Paris aos domingos se assemelha à São Paulo de trinta anos atrás.

A fábula das formigas alemãs e das cigarras vizinhas é uma simplificação jornalística, porque ignora a compleição de cada um (esquece-se também que a Alemanha tem lá as suas bombas de efeito retardado) e os efeitos deletérios da adoção do euro, em 1999, que poderia ter sido feita de maneira menos atabalhoada, dado que foi como decretar que, a partir dali, todos os europeus aderentes passariam a ter peso e altura idênticos.

Seja como for, a simplificação funciona no seu roteiro básico com um dos vértices da figura que o professor Garton Ash desenha desta forma: “Enquanto governos, empresas e famílias empilhavam insustentáveis níveis de dívidas, jovens europeus de Portugal à Estônia e da Finlândia à Grécia tomaram como garantidas paz, liberdade, prosperidade e segurança social. Quando a bolha explodiu, o fato deixou muitos amargamente desapontados e induziu a lancinantes divergências entre as experiências de diferentes nações. Neste momento, a Europa mostra falta das forças propulsoras que antes a propeliam em direção à unidade. Mesmo que o medo comum das consequências do colapso da zona do euro a salve do pior, a Europa precisa de algo mais do que o medo para retomar o seu projeto magnético de meio século”.

O algo mais é o reconhecimento — ou a criação, vá lá — de uma identidade fone o suficiente para resistir sem rachaduras à sucessão de conjunturas nem sempre favoráveis. É espantoso como, desde o lançamento das suas bases, a UE não conseguiu inculcar nos seus cidadãos a convicção de que pertencem a um conjunto. Para fazer esta reportagem, VEJA ouviu jovens dos "big five” — Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Espanha. Em consonância com as sondagens efetuadas pelos institutos de pesquisa, nenhum deles se considera europeu no sentido imaginado pelo alemão Konrad Adenauer, pelo holandês Johan Willem Beyen, pelo francês Robert Schuman e pelo italiano Altiero Spinelli, pais dessa pátria inexistente nas almas. As moças e os rapazes entrevistados pertencem à classe média, bem como os leitores de VEJA, e recebem ou receberam uma ótima educação. É um prazer escutá-los. Vocalizam com clareza a sua visão da realidade, interessam-se por temas espinhosos como impostos excessivos e imigração, conhecem as ameaças ao seu desenvolvimento — e, a despeito do naufrágio da maioria das economias, na contramão da tendência, mostram-se otimistas quanto à capacidade de emergir adultos.

A Europa, no entanto, é-lhes distante como ideia, embora identifiquem vantagens advindas do bloco e desvantagens proporcionadas pela burocracia encastelada em Bruxelas. Uma boa ilustração é a fala do inglês Jonathan Kemeys, de 22 anos. Sua concepção não é tão diferente da cultivada por Lord Byron, o poeta romântico do século XIX. Diz o rapaz: “Geográfica e politicamente, o Reino Unido é pane do continente, mas, em espírito, nós tendemos a nos ver como uma porção separada, talvez por sermos ‘ilhéus’. Quando ouço falar em Europa, penso nos antigos países católicos, como França, Espanha e Itália. Penso nas ruínas romanas, na arquitetura maravilhosa, no Mediterrâneo e nas paisagens verdejantes. Uma história complexa de guerras, religião, política, impérios e conquistas. Há dois anos, economizei dinheiro e viajei durante o verão, com a minha namorada. Não esqueço os lugares visitados por nós, especialmente Roma, Paris, Veneza e Budapeste”.

Jonathan, filho de administradores de empresas, teve de economizar dinheiro para viajar. Quantos rebentos da classe média brasileira são obrigados a fazê-lo? Em geral, eles recebem viagens de presente. Trata-se de uma diferença importante, motivada não pelo momento, e sim pela formação das mentalidades ao longo dos séculos em que se alternaram abundância e escassez, paz e conflito. É primordial aprender a andar com as próprias pernas desde cedo. Nisso, ingleses e continentais são semelhantes. Um jovem francês, por exemplo, não recebe mesada, muito menos leva um carro quando completa 18 anos (no máximo, é presenteado com uma lambreta). Para pagar custos como transporte e alimentação fora de casa, é obrigado a se virar com uma média de 100 euros por mês, o equivalente a 300 reais. Não sobra quase nada para a diversão. A contrapartida, ao menos em Paris, é que dá para comprar cerveja no supermercado e ir para a Ponte des Arts ou marcar um piquenique no novo parque às margens do Sena. E ninguém vai expulsá-lo de uma brasserie se você passar horas bebendo um café. Para ir além de tais possibilidades, ou se junta dinheiro, renunciando ao máximo do mínimo, ou se vai trabalhar em empregos temporários para aumentar o parco rendimento. O aspecto é interessante para entender o tamanho da perplexidade. Apresenta-se difícil até seguir esse caminho didático. Com a queda dos salários e a desocupação, diminuiu o consumo — e o setor de serviços, fonte por excelência dos trabalhos temporários juvenis, deixou de contratar ou se tornou alvo de gente mais velha, desesperada por qualquer salário.

É necessário atravessar a aridez das cifras para avistar o panorama de devastação. Os índices de desocupação de moças e rapazes, normalmente maiores em qualquer latitude, devido às peculiaridades da idade, exibem níveis alarmantes que aceleram para cima. De acordo com a estatística mais utilizada, aquela que afere o desemprego dos jovens de 15 a 24 anos que estão à procura de trabalho, e descarta aqueles que apenas estudam, o número é de 60% na Grécia, 50% na Espanha, 40% na Itália e 25% na França. Entre as grandes economias, a Alemanha é um ponto fora da curva. A situação não é tépida na faixa imediatamente acima, de 25 a 29 anos, quando se passa à condição de jovem plenamente adulto. A taxa de desemprego cai, mas o espectro do trabalho temporário, sem vínculo formal ou com contratos de brevíssima duração, assombra. Na Espanha, o pior dos cenários, quatro em cada dez cidadãos próximos dos 30 anos fazem bicos ou mantêm laços precários com os seus empregadores, sem nenhuma garantia de renovação ou coberturas que a lei confere aos que têm o correspondente brasileiro do registro em carteira. Em quase todos os países da UE, não importa se a profissão é de nível técnico ou superior, ou se o desempenho é excelente, bom ou medíocre, os salários de rapazes e moças permanecem estacionados entre 800 e 1200 euros mensais (2400 a 3 600 reais). O que parece uma quantia razoável no Brasil não dá para declarar independência ou sustentar uma família no mesmo padrão da geração europeia nascida na década de 60.

Um estudo da fundação Ermanno Gorrieri intitulado “Generazioni disuguali” (“Gerações desiguais”) fornece um retrato de como a ladeira, na Itália, tem apenas uma pista, e é na descendente. Há vinte anos, feita a transposição da lira para a moeda única, o salário médio anual de um trabalhador de menos de 30 anos era de 13000 euros. Hoje, é de 10000. Na década de 80, mais de um terço dos jovens entre 20 e 29 anos ocupava uma posição profissional melhor do que a de seus pais. Essa fatia, em 2013, não chega a 20%. É a primeira vez, desde que a Itália se tornou uma república, que uma geração está pior do que a precedente. Dá para entender por que metade das moças e rapazes a deixaria. Aliás, é o que estão fazendo. O destino mais procurado é a Alemanha, claro. O Leste Europeu, que roubou muitos empregos da porção ocidental, por causa da mão de obra mais barata, é outro destino dos italianos. Já há um verdadeiro enclave, na cidade de Wroclaw, de peninsulares altamente qualificados, atraídos pela oferta de emprego nesse centro de tecnologia na Polônia. Os salários são baixos, mas a) eles existem; b) vive-se bem com menos; c) subir na carreira não é miragem.

Como apenas indignação não põe a mesa, os espanhóis caem fora até em direção ao Marrocos. Uma moça de boa posição social, como Mélina Cloup, de 18 anos, aluna de uma faculdade respeitada em Madri, só encontra horizonte adiante das fronteiras, como ela declara em seu depoimento na página 93. Os franceses, que há dez anos vêm trocando Paris por Londres, por causa do Fisco, armaram uma segunda rota de fuga para o Canadá, agora em busca de salário. A remuneração de pessoas com nível universitário, quando há, é 15% menor do que dez anos atrás, e não adianta ter um diploma de uma grande école de administração ou engenharia para reverter a curva. O canudo de uma universidade de ponta, embora continue a ser vantagem competitiva, não representa mais chancela de sucesso. Há duas semanas, um manifesto assinado por três franceses — um consultor, um cantor de rap e um jornalista — foi publicado no jornal The New York Times. Sob o título “Jovens franceses, a sua saúde está no exterior: se mandem!”, eles acusam a França de ser governada por uma “gerontocracia ultracentralizada e esclerosada”, de ser um país em que “uma elite cuja idade oscila em torno dos 60 anos decide um pouco sobre tudo e onde um quarto da juventude está desempregado”. A tintura no cabelo do presidente François Hollande não tapeia.

Um dos resultados demográficos dessa situação é que os jovens se casam ainda mais tarde (quando se casam), têm ainda menos filhos (quando têm) e moram em repúblicas até tarde — quando não regressam, derrotados, ao ninho paterno. Desde 2008, a idade média dos rapazes que saem de casa para tentar um voo-solo ou em companhia da sua outra metade subiu para 31 anos na Itália, 30 anos na Grécia e 29 anos na Espanha. Não bastassem os aborrecimentos cotidianos proporcionados por marmanjões dependentes, o impacto econômico do fenômeno é vastíssimo, em especial para um continente que precisa incrementar a sua taxa de natalidade, a fim de se manter no pelotão da frente das economias industrializadas.

Se a situação dos desempregados é dramática, a dos neets é trágica. Trata-se da sigla, em inglês, para a população entre 15 e 34 anos not currently engaged in employment, education or training (atualmente sem emprego, escola ou treinamento). Sim, um bom pedaço desse universo é de trintões que deveriam estar preocupados em acumular dinheiro para a educação do primeiro filho e em via de ter o segundo. Os dados fornecidos a VEJA pelo Eurostat, o instituto de pesquisas da União Europeia, são arrepiantes. Extraindo-se a ofuscante Alemanha, as taxas, há anos altas, aumentam constantemente, em desafio a qualquer prognóstico róseo. Mais de 1 milhão de ingleses na sua melhor fase produtiva apresentam-se completamente ociosos, enquanto 1,9 milhão de franceses estão de braços cruzados e pés em cima do sofá. Quanto à Itália, a ruína neet é de dimensões romanas: 2,1 milhões de ragazzi e ragazze encontram-se num amaro far niente. Para se ter uma noção da proporção, note-se que, juntos, os três países não perfazem a população total do Brasil. O custo da UE com o amparo à armada de desesperados e desesperançados alcançava, em 2011, 153 bilhões de euros por ano — valor semelhante ao do produto interno bruto do estado do Rio de Janeiro, o segundo mais rico do Brasil. Diz o inglês Jonathan Todd, representante da Comissão Europeia para a inclusão social: “O preço que pagamos pelos atuais níveis de desemprego juvenil ou pelo emprego precário é alto demais. Estamos arriscados a ver uma geração inteira desperdiçada. Um desastre de qualquer ponto de vista”. Ninguém precisa ser original em Bruxelas, basta ser nítido.

O mal-estar na Europa vem se traduzindo em ressaca. No século XIX, num dos seus arroubos, o poeta francês Charles Baudelaire fez o elogio da embriaguez — de vinho, poesia ou virtude. Como vinho bom é mais caro, poesia é artigo de luxo e está difícil exercer a virtude por falta de vagas, enfia-se o pé na jaca, para usar uma expressão brasileira que horrorizaria Baudelaire. O Ministério da Saúde da França advertiu em maio: ser jovem faz mal à saúde. Com a crise, aumentou, em todas as classes, a quantidade de viciados juvenis em substâncias legais ou ilegais, leves ou pesadas. Fuma-se mais e consomem-se pantagruelicamente maconha, cocaína e heroína — o consumo da substância alucinógena dobrou desde 2000, e sempre dá para comprar uma partida com o dinheiro do lanche. A bebedeira tem um agravante: tornou-se frequente o binge drinking ou biture express, em francês. A farra da bebida consiste em enfiar goela abaixo, um após outro, cinco, seis, sete copos de vodca, uísque ou o que for, desde que seja fone. Mais da metade dos francesinhos de 17 anos admitiu ter encarado o biture express pelo menos uma vez. A experimentação e os excessos próprios da idade adquiriram o gosto de fuga da realidade.

Ser um desocupado em nossos zangados trópicos é, na pior extremidade da pirâmide, padecer no inferno do crime, da mendicância e do salário de fome. A versão nacional, enfim, do mote beatnik “livefast, dieyoung" (“viver rápido, morrer jovem”). Na Europa, é vegetar em dias repetitivos, no purgatório da rede de proteção social, e contribuir para o depauperamento da poupança de famílias em dificuldades. Na Itália, que costumava ser poupadora disciplinada, a taxa média de dinheiro acumulado por família caiu de 24% da renda, no início da década de 90, para menos de 10%, segundo a Bankitalia, o banco central italiano. Taxa média, enfatize-se, porque quase sete em dez famílias não conseguem chegar ao fim do mês no país em que, do início do ano até junho, cinquenta empresários falidos suicidaram-se.

Os jovens que decidiram tomar as ruas brasileiras protestam por questões há décadas superadas pelos europeus afluentes. Todavia, é inegável que a tensão pela situação econômica, acrescida de outras disfunções, também está no ar na Europa. Volta e meia, ela escapa aos mecanismos de controle, e não há um padrão para os estopins. Na Grécia e na Espanha, com menos amortecedores, a falta de emprego e as medidas de austeridade são razões evidentes para marchas estridentes. Em nações mais ricas, o malaise extravasa de outras formas. Em 2011, no episódio que vem sendo comparado às manifestações no Brasil, a morte de um rapaz negro, Mark Duggan, alvejado pela polícia numa ação desastrada, provocou depredações numa escala jamais vista na Inglaterra. Há dois meses, quando o Paris Saint-Germain comemorou a vitória no campeonato francês, a região do Trocadéro, de onde se tem a mais bela vista da Torre Eiffel, virou uma praça de guerra a partir do nada, protagonizada por vândalos anarquistas — os black blocs.

Em junho, a França chocou-se com o assassinato de um militante de extrema esquerda, Clément Méric, de apenas 18 anos, estudante da Sciences Po, a prestigiada escola de ciência política de Paris. Um skinhead acenou-lhe um golpe na cabeça, com soco-inglês, na saída de uma loja para adolescentes na região dos grandes bulevares, onde ambas as facções compram as suas respectivas indumentárias características. Méric teve morte cerebral imediata. O episódio revelou como fascistas e antifascistas juvenis — é dessa maneira que eles se autodenominam — se confrontam nas ruas da França, movidos menos por política e mais por um espírito de gangue ressuscitado pelos tempos difíceis. Episódios como o ocorrido recentemente num internato católico de elite são abafados: no último dia de aula, os alunos entraram mascarados e espancaram o diretor. Quebraram-lhe os dois braços. Imigrantes são hostilizados, mas o contrário é igualmente verdadeiro. Nas escolas públicas, franceses brancos católicos são ameaçados por árabes e afins. Em Paris, muros trazem a seguinte inscrição: “Dans dix ans, la France sera musulman” (“Em dez anos, a França será muçulmana”). Na verdade, será em sessenta anos, segundo os demógrafos. A ferver a chapa do rancor e da xenofobia cruzada, o fogo da recessão e da ausência de perspectivas.

Para amenizar esse contexto, a Alemanha dispôs-se a conceder milhares de bolsas de estudos e a transferir os pilares do seu modelo escolar aos interessados. “O problema do desemprego juvenil requer criatividade”, disse a chanceler Angela Merkel. Pois é, a encrenca é tão colossal que An-ge- la Mer-kel apela à criatividade... O professor de economia Klaus Schwab, fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, destaca que a integração máxima entre escola e mercado de trabalho é a chave do êxito alemão, porque também permite preencher de modo rápido e eficaz os vazios do setor produtivo. Faz sentido. De acordo com Jonathan Todd, há 1,7 milhão de postos de trabalho na UE, à espera de jovens treinados e desavisados. Há outra medida em estudo na França e na Itália, de caráter emergencial, mas inspiradora do lado estrutural: propor aos que estão a três anos da aposentadoria dar expediente de meio período em troca de salários menores, sem perda no valor das pensões. Eles dariam lugar a rapazes e moças de até 25 anos, admitidos com encargos mais baixos. Para fechar a conta, é preciso enxugar os gastos estatais. Voltamos, portanto, ao ponto inicial.

O resumo dessa ópera triste é que o tradicional estado europeu — o Leviatã que tolhe o indivíduo — não responde às necessidades dos cidadãos de uma federação de países. Como substituir o velho caduco? Ninguém sabe. A certeza é que passou da hora de compactá-lo, de Portugal à Estônia, da Finlândia à Grécia. Soa “receita Palmirinha” demais para uma iniciativa tão grandiosa como a União Europeia? Lembre-se que é no dia a dia das pequenas ações que as conquistas extraordinárias são obtidas. “Um dia é empurrado pelo outro”, escreveu o poeta romano Horácio. É na construção minuciosa de um presente que mire o futuro que se tirará a juventude da Europa da paralisia que lhe parece eterna. ■

terça-feira, 18 de junho de 2013

A boa e velha corrente por e-mail.

Na mensagem original ao final desta, um resumo didático sobre o ponto a que chegamos. 

Apenas acrescento que existem ainda:

- a "bolsa manifestante", aquela em que o vagabundo pode ir às ruas com a CERTEZA de que a polícia não usará bala de borracha para rechaçar os vândalos, porque o governador cagão cedeu à patrulha da imprensa deslumbrada. Só não vale reclamar quando o primeiro morrer pela bala do "seu cana" que meteu o dedo na pistola para não morrer espancado;
- a "bolsa Patrícia Poeta", aquela que garante uma cobertura televisa amistosa, sempre achando muito lindo as ruas tomadas pelos "pacíficos manifestantes" e esquecendo que eles impedem o povo de verdade de chegar em casa depois de mais um dia trabalhando para sustentar os que se acham no direito lhes tomar tudo. Afinal, o "passe livre" será pago por quem? Só não é pelo PT...
- a "bolsa amnésia", que tem o condão de, no próximo ano, fazer dos leões indignados de hoje, os cordeirinhos, jumentos e antas que meterão o dedo na urna sem dó do povo: 13, 13, 13.

Ora, se essa turma quisesse mesmo uma revolução de verdade, pararia de dar sustentação à safadeza do PT e do bando que corrói a riqueza dos que produzem. Pararia de renovar, a cada eleição, o compromisso com o crime.

Um Abraço,

Licurgo Nunes Neto

Omnia praetereunt, 
praeter benefacta piorum.


----- Mensagem encaminhada -----
Enviadas: Terça-feira, 18 de Junho de 2013 11:04
Assunto: Kit do Vagabundo...






Kit do Vagabundo...
(Leia com atenção, porque talvez ainda de tempo de salvar a nação)
Pra todos refletirem sobre o assunto... Veja na 2ª parte os kit's oferecidos pelo nosso atual governo...
MARGARETH THATCHER ESTAVA CERTA...
Sabe quantos países com governo socialista restam agora em toda a União Europeia?
Apenas 3:
1. Grécia  2. Portugal  3. Espanha.
Os 3 estão endividados até o pescoço.

Por que será, hein?

A esquerda não diz que o socialismo é a solução para o mundo?
Como bem disse Margaret Thatcher, quando 1ª Ministra da Grã-Bretanha:
"O socialismo dura até acabar o dinheiro dos outros."

"
É impossível levar o pobre à prosperidade através de legislações que punem os ricos pela prosperidade.
 
Para cada pessoa que recebe sem trabalhar, outra pessoa deve trabalhar sem receber.
 
O governo não pode dar para alguém aquilo que tira de outro alguém.
 
Quando metade da população entende a ideia de que não precisa trabalharpois a outra metade da população irá sustentá-lae quando esta outra metade entende que não vale mais a pena trabalhar para sustentar a primeira metadeentão chegamos ao começo do fim de uma nação.
 
É impossível multiplicar riqueza dividindo-a.”
- Adrian Rogers, 1931
O pior é que esse governo petista repete todos esses erros que colocaram essas nações de joelhos.
No nosso caso as coisas são um pouco piores porque nunca antes na história desse país um governo roubou tanto.

KIT DO VAGABUNDO
*Vai transar?*
O governo dá camisinha.

*Já transou?*
O governo dá a pílula do dia seguinte.

*Teve filho?*
O governo dá o Bolsa Família..

*Tá desempregado?*
O governo dá Bolsa Desemprego.

*Não fez planejamento familiar
e teve um filho com cada pai?
*
O Governo da Bolsa ESCOLA

*Vai prestar vestibular?*
O governo dá o Bolsa Cota.

*Bebeu a vida toda, não parou em emprego nenhum
não tem dinheiro pra comprar os remédios?*
o Governo dá remédio de graça

*não quis estudar e agora não tem dinheiro?*
o Governo faz sorteio de casa própria.
ai vc se livra do aluguel


*Não tem terra?*
O governo dá o Bolsa Invasão e ainda te aposenta.
Distribui-se ainda:
Vale leite
Vale gás
Vale refeição
Vale transporte
E tem ainda o Genial Vale Crime (Esse é o melhor de todos)
*RESOLVEU VIRAR BANDIDO E FOI PRESO?*
a partir de 1º/1/2011 O GOVERNO DÁ O AUXÍLIO RECLUSÃO?

*esse é novo* 
Todo presidiário com filhos tem direito a uma bolsa que, 
é de R$ 915,05 – Portaria nº 02, de 6/1/2012 "por filho" para sustentar a família, 
já que o coitadinho não pode trabalhar para sustentar os filhos por estar preso.
 
Não acredita?
Confira no site da Previdência Social.
Portaria nº 48, de 12/2/2009, do INSS
(http://www.previdenciasocial.gov.br/conteudoDinamico.php?id=22)
É GENIAL OU NÃO É!?
O SUJEITO MATA O TEU FILHO E ALÉM DE SER TRATADO COMO UM COITADO E VITIMA DA SOCIEDADE, VOCÊ AINDA PASSA A SUSTENTAR TODA A FAMILIA DO SAFADO.
Deve ser o único país do mundo ondo o criminoso é premiado e a família da vitima punida.

*Mas experimenta estudar, 
andar na linha, pagar as contas e os impostos 
pra ver o que é que te acontece!*

"Trabalhe duro, 
pois milhões de pessoas que vivem do Fome-Zero e 
do Bolsa-Família,  sem trabalhar, dependem de você"

Se você é brasileiro passe adiante.
Se você e otário...fica na moita...

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Discurso na instalação da paróquia de Marcelino Vieira

 

http://www.folhaemdia.com/2011/03/50-anos-da-paroquia-de-santo-antonio.html

terça-feira, 1 de março de 2011

50 anos da paróquia de Santo Antônio: Folha em Dia publica discurso proferido na solenidade de instalação da Paróquia

O email de contatos do Folha em Dia tem nos servido, muito grandemente, para pautar nossas matérias e para estreitar os laços com o nosso webleitor. Na semana passada ecebemos um email de Licurgo Nunes Quarto, leitor assíduo da nossa Folha, e que nos enviou um documento muito importante que merece ser publicado para os vieirenses.

Na oportunidade do Jubileu de Ouro da Paróquia de Santo Antônio, Licurgo Nunes Quarto nos envia a cópia do discurso proferido pelo Desembargador Licurgo Nunes na solenidade de instalação desta paróquia. A solenidade foi presidida por Dom Gentil Diniz Barreto, Bispo Diocesano.

À época foi formada uma comissão composta de cidadãos notáveis da Cidade, e o Desembargador Licurgo Nunes era o Presidente da referida comissão.

Diante das festividades celebradas esse ano pela paróquia, o ineditismo deste documento vem compor o acervo de registros históricos de um momento tão importante, que se confunde com a história de nossa gente vieirense. 

O Folha em Dia agradece a participação do nosso leitor. E se mantém a disposição de todos.

Vamos ao email:

Caríssima Jornalista e blogueira

IVANÚCIA LOPES

Desnecessário dizer que sou leitor assíduo do seu blog, pois isto eu já o disse de outra feita em que a você me dirigi. O blog continua muito bom, sem se falar no deleite de, ao acessá-lo,  tomar conhecimento das coisas e fatos que acontecem na nossa terrinha.

A propósito de uma notícia que você postou sobre o “Cinqüentenário da criação da Paróquia de Santo Antonio”, estou enviando – e você dê o destino que melhor lhe aprouver –  cópia do discurso proferido pelo Desembargador Licurgo Nunes, quando da solenidade, presidida por Dom Gentil Diniz Barreto – Bispo Diocesano à época -  de instalação da supra citada Paróquia.  Creio tratar-se de um documento  raro, inédito, que, com certeza, irá  contribuir para preservar, para a posteridade, e para as gerações futuras, um pouco da história da Paróquia de Santo Antonio.

À época foi formada uma comissão composta de cidadãos notáveis da Cidade, e o Desembargador Licurgo Nunes era o Presidente da referida comissão.

Junto à cópia do discurso, segue a relação dos componentes da comissão a que me referi anteriormente.

Fica o registro.

Abraços,

Licurgo Nunes Quarto

DISCURSO PROFERIDO PELO DESEMBARGADOR LICURGO NUNES, QUANDO DA INSTALAÇÃO DA PARÓQUIA DE MARCELINO VIEIRA:

Padeço de acentuada responsabilidade neste mister a mim cometido – traduzir – interpretar os sentimentos de gratidão dos habitantes e dos concidadãos deste Município de Marcelino Vieira – face ao dadivoso Decreto Episcopal instituinte da nossa Paróquia.

Preliminarmente invoco condescendência – peço vênia – em cobertura de conceitos emissíveis acaso desarrazoados – ou pertinazes – por culpa dos meus frágeis conhecimentos teológicos – eis que falando estou aos príncipes da nossa Santa amada Igreja.

Sr. Bispo Diocesano

Nossos concidadãos daqui pleitearam, sofregamente, perante V. Excia., a criação da Paróquia, antes de  a eles vir a Diocese neste sentido.

Sei por que isto.

A Diocese nem enxergava possibilidade financeira da população, nem se atreveria mais a submeter um Pároco às privações ambientes de uma Paróquia desrecursada.

Entanto, o ideal, que era antigo, venceu,  como afinal vencem todas as justas aspirações da humanidade, quando equacionadas sob força de vontade, persistência e fé.

O fruto é colhido hoje, na sede da semeadura, como natural.

Conseguimos adquirir os subsídios necessários à formação do patrimônio assecuratório da subsistência de um Vigário à nova Paróquia. Todos neste Município, com poucas exceções, se mostraram concorrentes àquela consecução. Arrecadação líquida de Cr$ 621.191,00.

Do patrimônio adquirido, resultará assegurada ao Padre uma mensalidade de Cr$ 12.000,00.

Se não é muito, todavia será algo, mais até do que dispõem outras Paróquias antigas.

Sr. Bispo Dom Gentil Diniz Barreto

Sempre reputei da maior indispensabilidade – de importância inigualável – a presença – a existência – de um Padre, mesmo nos menores núcleos populacionais.

Aqui, exercera a sua eficiente e devotada pastoreação – às suas periódicas visitações – durante o seu já vintenário paroquiato em Pau dos Ferros – S. Excia o  Cônego Manoel Caminha Freire – esse magnífico serventuário do catolicismo – condutor espiritual dos mais aprimorados – inteligência lúcida – cultura privilegiada – artífice das mais deslumbrantes realizações do apostolado cristão, cedido do Ceará – a princípio deshumurado, saudoso, recalcitrante – mas depois e atualmente radicado como qualquer nativo intransigente – pleno de amor terreal, dedicado amigo de tudo e de todos – incapaz de ir-se – no que aliás não consentiríamos.

A esse grande Sacerdote ora rendo o preito de gratidão dos seus ex-paroquianos, concedendo-lhe o exercitamento do seu direito de opção, que receberíamos de bom grado.

Sr. Bispo Diocesano

Reportava-me à necessidade da permanência de um Padre à localidade.

O papel desempenhado por ele só pode ser descrito por mais bela e delicada imagem. É o mestre de rudimentos em todos os setores – o catequista – o confidente – o guia espiritual – o apaziguador – o condutor social, e o líder das massas, na boa termologia, no bom sentido, liderança de que a Igreja precisa hoje mais do que nunca.

O bom Padre – e praza  aos Céus o tenhamos logo de partida – assumindo os afazeres de uma Paróquia nova – num Município assim ainda desprovido – pode modular os caracteres – a mentalidade dos seus pastoreados, num trabalho quer do tênue e quer do cerne.

Crianças, adolescentes e adultos aqui existem carentes de luzes e sedentos do catolicismo.

Nesses alicerces, erguem-se a verdade e a justiça – pressupostos basilares da família de Deus – da fraternidade  em Cristo.

A doutrina comunista, porém, se propõe a solução semelhante, entanto por intermédio da luta de classe, mediante disputas, dissídios e ódio.

Pretendendo estabelecer paralelo – o Comunismo por esse método diverso procura, em vão, imitar certos dogmas católicos – exatos pioneiros da   coexistência social.

Já o Apóstolo São Paulo – mostrava a necessidade do trabalho para a subsistência individual de cada um: - “quem não quiser trabalhar não tem o direito de comer”.

Já a Rerum novarum ( Encíclica de Leão XIII – de 15/05/1891) – previa hipóteses e disciplinava normas dessa coexistência – necessária e pacífica. .

Remontando-se o Sertão da Montanha então – eis o maior repositório de doutrinas sociais em tese – muito mais consentâneas de que o Manifesto comunista de Marx.

As profundas transformações sociais, introduzidas pela Igreja Católica – por meios suasórios profíquos, é certamente o que enfurece ao Buchevismo, a respeito retardatário.

E a conseqüência vem sendo a sua fúria desenfreada sobre a Igreja.

Sempre que oportuno o sacrifício como vindita, os Padres católicos são as vítimas indefesas da sua tirania inominável.

A Igreja e a hodierna concepção dos tempos conciliam-se perfeitamente, na base da Filosofia de que se impregnar possa o homem possuído do puro instinto cristão, como pondera Jacquis Maritan.

Sr. Bispo Diocesano

Dom Gentil Diniz

Reverentes – aqui estão os cidadãos desta nova Paróquia – prestando a V. Excia a sua justa homenagem de gratidão – pelas messes colhidas da generosidade e da atenção com que por V. Excia foram tratados e resolvidos os problemas atinentes à criação desta Paróquia. Deus compensará a quem difundir os seus princípios e ampliar a sua Igreja.

É a mensagem de paz – candura e amor.

E o alvo é V. Excia.

Tenho dito.

Desembargador Licurgo Nunes

COMPONENTES DA COMISSÃO ENCARREGADA DE VIABILIZAR A INSTALAÇÃO DA PARÓQUIA DE MARCELINO VIEIRA:

Desembargador Licurgo Nunes

Pedro Nonato Fernandes

José Medeiros de Andrade

Manoel Vicente de Oliveira

José de Calazans Fernandes

Osmundo Alvarenga

Vicente Lopes Fernandes

Lupecínio Fernandes Queiróz

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Contemplação mnemônica

Tudo começa com um texto de Pondé: A filosofia de lavar a louça.

Ela responde assim:

A lot of "food for thought", but what really caught my attention is the "contemplation" part of the spirit. Looking into it very closely, I realize I have given a lot of  care to studying and working, but have neglected contemplation. Should I spend whatever is left of my life in cotemplation so that by the time I part with life my spirit is a bit more complete? No need to reply; there is no answer to this question. Just, as I said, food for thought.

Love u

HN


Ele argumenta:


Engraçado: eu achava que

o entusiasmo em reunir os filhos em dias santos ou em quaisquer outros; 
a animação com os primeiros passos trôpegos de uma neta; 
a devoção para com aos ascendentes, idos e presentes; 
o prazer em inventar receitas novas;
o cultivo à memória dos ausentes;
o entusiasmo em se embrenhar galopante numa serra ossuda;
a alegria do banho de rio serpenteante no buraco doutorado;
o destemor de um passeio infanto-juvenil em dunas remotas;
o dirigir empoeirado em caminhonete catabilhante;
o preparo meticuloso de bolo tardio, comprido e temperado;
a abnegação de povoar o mundo com Piratas, She-ras e Sissies;
a alegria em receber próximos, agregados, afins e nem tanto;
a mão amiga e desinteressada a desconhecidos de outra pátria; 
a iluminação de buscar a Paz, o Amor e a Fraternidade sem cálculos ou recompensas, enfim, 
só se explicassem por uma aguda, contundente e generosa percepção do Divino!

Ora, se isto não é a essência, a razão e o fim de todo exercício contemplativo, já não sei o que fazer com as muitas imagens moldadas lá em meu infante país mental, que afastam as asperezas da vida, renovam as esperanças no Homem, sinalizam novas auroras e alimentam a fé e a certeza no Eterno, no Bom, no Justo.

...

Amo muito você.
Muito obrigado por tudo.

sábado, 24 de novembro de 2012

Da chantagem à extorsão – uma greve menos imoral


A mensagem que segue foi enviada em resposta a e-mail do presidente de um sindicato de servidores públicos, em que ele conclamou a categoria a aderir ao movimento de greve que naquele agosto de 2012 parava os serviços estatais no Brasil.
Entre as ações propostas pelo sindicato, estavam as operações-padrão, que vêm a ser quaisquer firulas que impeçam o livre trânsito de pessoas, veículos ou cargas, sempre com grande repercussão midiática associada aos transtornos criados.
Senhor Presidente e Camaradas Paredistas,
Após ler com atenção as razões apresentadas pelo comando de greve e vendo que aquele item sobre a implantação do caos foi plenamente alcançado, a julgar pelas notícias na imprensa nacional nos últimos dias, ocorreu-me a seguinte ideia.
...
CONSIDERANDO:

a) que, em vez de garantidores dos direitos constitucionais do indivíduo, notadamente o referente à livre locomoção no território nacional, nos tornamos ciosos e orgulhosos cerceadores do direito de ir e vir da população a que deveríamos servir;
b) que, em vez de demonstrar nossa relevância institucional através dos esforços de preservação da ordem, incolumidade das pessoas e do patrimônio de terceiros, optamos por ser meros vetores do caos, do grave estresse pessoal, da perda de tempo, do perecimento de mercadorias e de outros prejuízos financeiros;
c) que, incapazes de pedir demissão para buscar lá fora uma remuneração digna de nossa grande capacitação, mergulhamos cada vez mais nesta relação esquizofrênica de amor e ódio com a turma que nos governa, outorgando-lhes a cada quatro anos o direito de renovar o ciclo de que tanto nos ressentimos; e,
d) que, o quadro descrito revela a clara perda do balizamento ético, legal e moral de nossas ações reivindicatórias;

PROPONHO:
A imediata suspensão da chamada operação-padrão pela EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. Sim, aquele mesmo previsto no art. 159 do Código Penal. Poderíamos sequestrar alguma autoridade governamental e exigir em troca de sua liberdade o reajuste salarial desejado. Afinal, se a greve é um DIREITO e se a lógica de uma greve de servidores públicos resume-se à chantagem pura e simples – à qual nos agarramos graciosamente –. convenhamos que cercear a liberdade de somente um indivíduo com poder de decisão certamente há de ser menos grave do que levar transtorno a centenas de milhares que, nada tendo a ver com questões sindicais, tampouco poderiam resolvê-las, pois não dispõem dos botões de controle do governo. Uma vez que optamos pelo ultraje à Constituição Federal, o que nos impede de infringir aquele artiguinho inocente do Código Penal?
Notem que, fazendo a coisa corretamente, nem mesmo seremos passíveis de punição, afinal o MST faz destas há muito tempo e tem sobrevivido incólume. Basta lembrar que a denúncia que se seguiu à invasão e à depredação de uma fazenda de laranjas não foi aceita pela justiça por não ter sido capaz de individualizar as condutas dos meliantes – no caso, nós mesmos. Se a coisa complicasse e algum companheiro caísse em desgraça, diríamos em sua defesa que a causa era justa e socialmente escusável, afinal não lutávamos pelo vil metal, mas pela ampla valorização do serviço público e contra as medidas neoliberais do partido de ocasião – que agora passou a defender a tal responsabilidade fiscal de FHC. Ou poderíamos dizer que vivíamos sob o estado de exceção imposto pela intransigência da presidente, o que nos levou a pegar em armas – com o perdão do trocadilho. Na melhor das hipóteses, reivindicaríamos a condição de perseguidos políticos, com direito a indenização e pensão vitalícia. Na pior, pediríamos asilo político em Cuba, podendo retornar mais tarde como salvadores beneméritos da nação. Funcionou outras vezes; haverá de funcionar em nosso favor.
Exaurindo o tema, lembro que a estratégia da extorsão mediante sequestro teria uma vantagem adicional: com um político a menos por aí, ainda que temporariamente, angariaríamos de imediato a simpatia de boa parte dos que, nos últimos dias, estavam indignados pelo atraso de vida imposto justamente por aqueles que têm a obrigação legal e constitucional de mantenedores da ordem e da segurança públicas. Imperioso destacar que a medida voltaria nossas ações contra quem efetivamente pode atender nossa eterna demanda por salários maiores, o que, convenhamos, é uma ação muito mais eficiente. De quebra, eximiríamos as levas de contribuintes (?!) do escárnio supremo de se saberem os idiotas que arcam com os custos daquela palhaçada, já que são eles que financiam seus algozes – no caso, nós mesmos. No contexto do gerenciamento de riscos, a estratégia do sequestro traria em si uma inextrincável contenção de danos.
Por fim, apenas precisamos resolver um problema de método do modelo ora proposto: com tantos candidatos potenciais a vítimas, digo, mártires, de nosso movimento social, democrático e popular, como chegaríamos a um nome ideal? Qual o critério mais justo? Grau de comando institucional ou poder de decisão orçamentária? Tem alguma idade limite para figurar no polo passivo da ação redentora? Levar-se-ia em conta a popularidade da excelência? Pode ser mais de um mandatário? É necessário que tenha um mandato eletivo?
Encaminhemos a votação.

...

P.S.: Alguns podem estar pensando se eu estou falando sério. Claro que não! Apenas quis demonstrar que os agentes de uma instituição, que se define pelos regulamentos que a criaram, ao resolverem pisotear a Lei e bloquear uma via, ainda que parcialmente, acabam por abrir as portas do arbítrio e de toda sorte de absurdos – e o maior deles é tornar reféns aqueles a quem nos cumpre defender. Ao desonrar a Constituição que nos tutela, estamos fornecendo as razões para que governo e população nos considerem, com plena justiça, infiéis defensores da ordem estabelecida e, portanto, não merecedores do seu abrigo. Transpostos os portões da institucionalidade, nos igualamos à turba ignara e insana que encontra em qualquer ilusão a justificativa para seus desvarios éticos. Além desses umbrais, nada nos distinguirá do banditismo, da imoralidade e da desgraça contra os quais, um dia, juramos lutar.
Pode alguém pensar que, a esta altura, eu não deveria estar fazendo graça com coisa séria. É... Mas foi o comando de greve de começou a brincadeira.

Atenciosamente,
Licurgo NUNES NETO

domingo, 17 de julho de 2011

Nos dias em que as súmulas vinculantes, a uniformização de jurisprudência, os princípios humanistóides de toda sorte, a patrulha do politicamente correto e as minorias influentes dão as cartas no judiciário, a atividade de julgar transformou-se na arte de adequar-se ao padrão vigente. Nesse contexto, o valor de um juiz de primeira instância é dado pelo número de sentenças confirmadas, sendo sua angústia perene a perspectiva de uma reforma. Exatamente por isto, a decisão do juiz Jeronymo Pedro Villas Boas, que anulou o registro de união estável de dois homossexuais de Goiânia - ignorando a autorização do STF - é um ponto fora da curva, admirável por sua independência e digno de registro.
No mero exercício de suas funções constitucionais, o juiz de primeira instância agigantou-se frente àqueles que deveriam lhe servir de fonte de conhecimento e de inspiração; tornou-se exemplo para aqueles de quem se esperam mostras de experiência, maturidade e temperança - requisitos inescapáveis aos que decidem sobre o patrimônio e a liberdade do indivíduo. O juiz, orientando-se pela lei posta, objetiva, impessoal e genérica, sem arvorar da função do legislador, demonstra sua lealdade ao texto constitucional e deixa o novato Luiz Fux aparvalhado em rede nacional dizendo que o STF é a "única" corte apta a dizer a constitucionalidade das leis - ato falho que revela as inclinações totalitárias que marcam a atual corte.
Em sua sentença, o juiz Villas Boas demonstrou que a Constituição reflete os valores morais de um povo e que ela materializa aquilo "que se sedimentou e evoluiu como comportamento natural na sociedade", incorporando-se de tal forma ao ordenamento jurídico da nação que nem mesmo a corte constitucional pode subverter seu significado sem que atente contra a vontade popular. Com isto, o juiz apresentou aos ministros os rudimentos da organização social e funcionamento do regime democrático.
O juiz Villas Boas lembrou que a Constituição, votada por representantes eleitos pelo povo, reconhece expressamente "a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar" e isto ocorre precisamente por ser nesta configuração que se tem o fundamento básico do relacionamento familiar: a constituição de prole comum. Nesta passagem, o juiz trouxe aos ministros fundamentos de lógica elementar e hermenêutica jurídica: homem e mulher, não pode ser lido como homem e homem nem mulher e mulher.
Discorrendo sobre liberdade, o juiz Villas Boas esclareceu que o ato de se relacionar com pessoas do mesmo sexo é decisão que pertence ao âmbito da vida privada e que a mera exteriorização desta prática não pode ser apta a ensejar a proteção que a Constituição devotou à unidade familiar. É quando o juiz permite aos ministros do STF lidar com as noções de causalidade e igualdade material, posto que também não existem direitos inerentes à pratica heterossexual em si.
Exatamente por ter sido democrático, racional e objetivo, o juiz Villas Boas é tido agora por retrógrado, conservador e preconceituoso; por ter honrado a magistratura em uma decisão marcada pela coerência semântica e factual, teve sua sentença avocada e cassada pela corregedora geral de Justiça de Goiás; por ter sido fiel à letra da Constituição, será lembrado no STF por sua insubordinação e rebeldia; por ter se limitado à função de dizer o direito, está associado ao objetivismo impessoal do direito posto e foi declarado inimigo da justiça social; por ter respeitado a igualdade formal perante a lei, a única possível dada a diversidade de aptidões dos homens, tornou-se alvo da sanha segregacionista do movimento gay e das hordas de autoproclamados fiscais do bem, que veem na profissão da fé cristã do juiz a única explicação para tal disparate, como se não se esperasse dos juízes, ainda que secundariamente, a devoção às leis.
Diante de patrulha tão aguerrida, o juiz Villas Boas não capitulou: anulou o segundo registro de união estável entre homossexuais - sob os mesmos fundamentos da primeira sentença - e requereu a revisão do ato da desembargadora corregedora, sustentando que a avocação e posterior cassação da sentença original exorbitou das funções daquele órgão, o que a faz padecer do vício da ilegalidade. Onde um homem comum recuaria, o juiz Villas Boas avançou na defesa convicta de seus princípios; em vez de lamentos e resignação, altivez e ações práticas.
É bem provável que as instâncias superiores do judiciário reformem em caráter definitivo as decisões do juiz Villas Boas e outras que venham a ser proferidas, repetindo a decisão anticonstitucional dos ministros do STF. Ao final desta questão, embora se sagrem vitoriosos os colegiados judiciários, sua ânsia de favorecimento às minorias barulhentas terá se dado à revelia das instituições e das leis. O juiz, vencido pelo coletivismo militante, é que terá defendido o regime democrático e usado as leis e a Constituição por escudo e fundamento. Eles terão desafiado a natureza e a realidade objetiva; o juiz terá amparado suas ações sobre os pilares da lógica e da razão. Àqueles, restará a desonra da fraude à Carta que juraram defender; ao juiz Jeronymo Pedro Villas Boas, a recompensa única e transcendente de construir uma mente livre de contradições.
Publicado originalmente em: http://www.midiasemmascara.org/artigos/direito/12212-admiravel-rebeldia.html